“Sol de montanha passando
(dia entre meias noites)
diáfano paralelo
sobre meu corpo, queimando.
Eu, linha, meridiano.”
– Ciça
Em uma época onde desenhar pessoas poderia ser arriscado e perigoso, a figura do pato foi uma boa saída para falar da política em época de ditadura. A idealizadora da tira “O Pato” (e que teve A HQ “Pagando o Pato” relançada em 2009 pela L&PM Pocket) foi colaboradora do Pasquim, publicou diariamente suas tiras em grandes jornais brasileiros, como Folha de S.Paulo, Jornal do Brasil e também no exterior. Tem mais de vinte livros publicados, entre poesias, quadrinhos e livros infantojuvenis. Lançou ainda a tira Bel, publicada por vários jornais, e a personagem Bia Sabiá, especialmente para publicações feministas.
Eu estou falando de Cecília Alves Pinto, mais conhecida como Ciça. Um dos nomes mais expressivos de quadrinhos feitos por mulheres no Brasil. No dia do Quadrinho Nacional é obrigatório lembrar de figuras como ela e o Lady’s não perdeu a chance de entrevistá-la.
Lady’s – Qual é a sua relação com as histórias em quadrinhos? Quando começou a fazê-las?
Desde bem pequena fui apaixonada por HQ. Tanto que meu pai, para que eu aprendesse inglês bem depressa, me dava só revistinhas e gibis americanos para ler (e a técnica dele funcionou! aprendi mesmo, desde cedo!). E eu comecei a desenhar para o suplemento do Jornal dos Sports no Rio de Janeiro, acho que em 1967.
Lady’s – Sabemos que também é escritora de poesias e livros infanto-juvenis. O quê, diferente desses estilos, o quadrinho pode lhe proporcionar?
Os quadrinhos possibilitam uma visão rápida e concisa de ideias. Meus temas sempre foram comportamentais e sobretudo comentários críticos sobre política e cotidiano. Livros infantis e poesia são o mesmo: poesia…
Lady’s – Fazer quadrinhos na época da ditadura deveria ser uma tarefa árdua para driblar a censura. Quais cuidados tomava ao fazer a tira “O Pato”?
Na época da ditadura a criação dos quadrinhos era ao mesmo tempo mais fácil e mais difícil. Mais difícil porque era preciso tomar cuidado para não cutucar a onça com vara curta demais: e o uso de metáforas tinha que ser na medida certa para que o recado fosse dado e compreendido, mas com o risco de censura ou coisa pior limitando a crítica. E, mais fácil porque a própria ditadura era ridícula em seu horror.
Lady’s – Não encontramos muita coisa sobre a sua personagem “Bia Sabiá”. Apenas lemos que ela fazia parte de publicações feministas. Você se considera feminista? Pode nos falar sobre ela?
Bia Sabiá teve a vida muito curta. Foi, sim, publicada em jornais feministas os quais também tiveram vidas curtas. Era um personagem simpático, mas que pelo tempo reduzido acabou não se fixando. E se feminista é quem acha que mulher tem que ter direitos iguais aos homens, devo ser…
Lady’s – Como em outras esferas percebemos que não há valorização do trabalho da mulher em relação aos quadrinhos. Você concorda? Acha que temos/sofremos algum tipo de preconceito por sermos mulheres fazendo quadrinhos?
Nunca senti preconceito por ser uma cartunista mulher. Sentia mais uma desvalorização em geral do trabalho de cartunistas e quadrinistas, mas acho que isso já está mudando faz tempo. Existem, mesmo, poucas mulheres quadrinistas, e isso é uma coisa mundial. Também acho um mistério, embora não ache que a resposta seja preconceito nessa área.
Lady’s – Tem acompanhado os quadrinhos feitos atualmente? Se sim, quais te interessa?
Continuo adorando quadrinhos. Gosto de muitos quadrinistas atuais, mas tenho meus prediletos: Laerte, Angeli, Adão Iturrusgarai, Niquel Nausea, Ota, Luis Gê. Dos antigos, eterna, a Marge, criadora da Luluzinha.
Lady’s – Para fechar pode nos contar se ainda faz quadrinhos?
Não tenho feito quadrinhos há um bom tempo, mas, quem sabe?
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Ainda comemorando o Dia do Quadrinho Nacional, reveja aqui os posts feitos sobre Pagu e Neide Harue.

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